A Vocação das e nas Comunidades Novas

24/01/2013 13:53

Fonte: Portal da Comunidade Shalom

Procuraremos traçar aqui um esboço (sim, nada mais que um esboço) da relação entre “Vocação” e “Comunidades Novas”. Não se pretende, portanto, exaurir um tema tão rico e complexo como este. Trata-se muito mais de lançar um olhar sobre o mosaico do que Deus tem realizado na Igreja nestas últimas décadas – no que se refere a estas novas realidades eclesiais –, sem querer entrar em seus detalhes.

Para isso, iremos utilizar algumas indicações dos Papas João Paulo II e Bento XVI vendo primeiramente a questão da Vocação das Comunidades Novas, para depois passarmos à questão das diversas vocações nelas existentes.

A Vocação das Comunidades Novas

As Novas Comunidades (ou Comunidades Novas) são realidades eclesiais bastante “jovens”. Ainda existe, até mesmo, conflito no uso de sua terminologia. Algumas realidades novas da Igreja querem ser chamadas de Movimento; outras preferem Comunidade Nova; outras ainda, Caminho. De fato, é importante perceber que nos documentos magisteriais ainda não é claríssima, por exemplo, uma distinção entre um Movimento eclesial e uma Comunidade Nova. E não é para menos: quando ainda era cardeal, Papa Ratzinger afirmou: “Dever-se-ia também atentar a não se propor uma definição muito rigorosa [para os Movimentos, e assim, também para as Comunidades Novas], porque o Espírito Santo tem prontas surpresas em cada momento, e só retrospectivamente temos condições de reconhecer que por trás das grandes diversidades existe uma essência comum”[1]. Assim, segundo Ratzinger, deve-se respeitar a natureza de mobilidade e novidade própria dos movimentos eclesiais e Comunidades Novas, sem querer chegar apressadamente a uma definição precisa. O que é claro, neste âmbito, é que tanto os Movimentos eclesiais quanto as Comunidades Novas ou outras dessas novas realidades eclesiais que vem surgindo aparecem como uma graça para a Igreja dos nossos dias, uma forma de viver a fé da Igreja radicada no hoje da humanidade, como resposta do Espírito Santo aos desafios do nosso tempo.

O termo Novas Comunidades – para indicar um novo tipo de associação de fiéis, predominantemente laical – não existia até poucos anos atrás, quando foi usado nos documentos de preparação para o Sínodo sobre a Vida Consagrada (Lineamenta), de novembro de 1992 (cf. n. 24). Dois anos depois, em uma Audiência Geral de outubro de 1994 (talvez ainda sem a ambição de cunhar uma expressão própria para essa novidade eclesial), o Papa João Paulo II mencionou o termo novas comunidades quando se referia ao conjunto de novas formas de participação eclesial que estavam surgindo. De passagem, disse o Papa: “Algumas destas novas comunidades têm uma linha propriamente monástica, com um notável desenvolvimento da oração litúrgica”[2]. No entanto, foi só durante o sínodo sobre a vida consagrada, e mais explicitamente, na exortação apostólica pós-sinodal Vita Consecrata[3]de 1996, que o termoNovas Comunidades foi, por assim dizer, “consagrado”, pois ali essas novas realidades eclesiais tiveram que ser tratadas mais de perto, pois já suscitavam grande interesse.

Mas qual seria a vocação, o chamado destas Novas Comunidades na Igreja? Podemos procurar responder a essa questão partindo, dentre outras, de algumas palavras de João Paulo II aos membros dos Movimentos eclesiais e Comunidades Novas durante a Vigília de Pentecostes de 1998. Dizia o Pontífice:

Que necessidade tem-se hoje de personalidades cristãs maduras, conscientes da própria identidade batismal, da própria vocação e missão na Igreja e no mundo! Que necessidade de comunidades cristãs vivas! E eis, então, os movimentos e as novas comunidades eclesiais: estes são a resposta, suscitada pelo Espírito Santo, a este dramático desafio de fim de milênio. Vocês são esta resposta providencial.[4]

A vocação das novas comunidades eclesiais seria, segundo o Papa, a de gerar, com o auxílio e a graça de Deus, personalidades cristãs maduras, conscientes da própria identidade batismal, da própria vocação e missão na Igreja e no mundo! O Papa definiu estas novas realidades eclesiais como resposta providencial de Deus para os desafios deste tempo, indicando como motivo desta resposta do Espírito Santo o surgir de uma personalidade cristã e batismal mais amadurecida e a força de uma fé vivenciada com alegria e vigor na comunidade eclesial. Não se trata aqui, obviamente, de exclusivismos; o Papa não se refere a uma única resposta de Deus para a Igreja, mas de uma resposta providencial. Trata-se de um forte reconhecimento dos dons e dos carismas que são próprios dos Movimentos eclesiais e Comunidades Novas.

Também Bento XVI pôde expressar, durante o II Seminário de estudo para os bispos, em 2008, a sua ideia de Comunidades Novas:

A nós Pastores é pedido que acompanhemos de perto, com paterna solicitude, de modo cordial e sapiente, os movimentos e as novas comunidades para que possam, generosamente, colocar a serviço da utilidade comum, de modo ordenado e fecundo, os tantos dons de que são portadores e que temos aprendido a conhecer e apreciar: o impulso missionário, os eficazes itinerários de formação cristã, o testemunho de fidelidade e obediência à Igreja, a sensibilidade às necessidades dos mais pobres, a riqueza de vocações.[5]

Assim, Bento XVI vai além de uma descrição genérica dessas novas realidades eclesiais. Aponta o impulso missionário, a capacidade de formação cristã, o testemunho de fidelidade e obediência à Igreja, a sensibilidade às necessidades dos mais pobres, a riqueza de vocações. Esse é o âmbito que encerra o chamado dessas novas comunidades: estar junto à Igreja, formando cristãos maduros, sensíveis às necessidades dos mais fracos e pobres, agindo através da riqueza de seus dons e vocações. E é a partir daqui que podemos entrar na segunda parte de nossa reflexão.

A Vocação nas Comunidades Novas

Papa Bento XVI falava da riqueza de vocações que os Movimentos eclesiais e as Comunidades Novas proporcionam à Igreja. Nas palavras de Bento XVI, essa riqueza de vocaçõespoderia dizer respeito às vocações dos Movimentos e Comunidades Novas – com os diversos carismas que cada uma delas possui –, que embelezam a Igreja dos mais diferentes modos, mas também poderiam referir-se às vocações nas Comunidades Novas e Movimentos eclesiais, que ali amadurecem, se formam. De fato, este espaço eclesial onde se espera que ocorra o amadurecimento da consciência, da identidade, da vocação e missão dos cristãos na Igreja, traz uma extraordinária novidade vocacional. São vocações diversas que são geradas ali. As Comunidades Novas são berços de novas vocações ao matrimônio, ao sacerdócio e à vida consagrada. O Papa João Paulo II expressou essa novidade ainda em 1996, apontando nela aoriginalidade própria das Comunidades Novas:

A originalidade destas novas comunidades consiste frequentemente no fato de se tratar de grupos compostos de homens e mulheres, de clérigos e leigos, de casados e solteiros, que seguem um estilo particular de vida, inspirado às vezes numa ou noutra forma tradicional ou adaptado às exigências da sociedade atual. Também o seu compromisso de vida evangélica se exprime em formas diversas, manifestando-se, como tendência geral, uma intensa aspiração à vida comunitária, à pobreza e à oração.[6]

Assim, as Comunidades Novas – graça que traz como vocação própria a formação de verdadeiros cristãos, como vimos – têm dentro delas uma enorme diversidade de vocações. Essa realidade vem ao encontro do que afirma o documento Apostolicam Actuosiatatem, do Concílio Vaticano II, que trata do apostolado dos leigos na Igreja. Diz o AA: “A partir do fato de ter recebido estes carismas, mesmo os mais simples, surge para cada fiel o direito e o dever de exercê-los para o bem dos homens e a edificação da Igreja”[7]Direito e dever! É, sem dúvida, uma exortação feita pelo Concílio aos fiéis leigos para que façam bom uso dos dons e carismas recebidos de Deus para o bem de toda a Igreja. Independentemente de um pedido da hierarquia da Igreja, o apostolado é direito e dever de todos enquanto cristãos. Como afirmou também Pe. Arturo Cattaneo, noto eclesiólogo suíço: “O apostolado não é mais visto só como cooperação com a hierarquia, mas como específica missão de levar o Espírito de Cristo a todas as realidades temporais, uma missão que está aberta a inumeráveis iniciativas sejam pessoais, sejam comunitárias”[8]. As Comunidades Novas, com sua diversidade de vocações (delas e dentro delas), são chamadas a assumirem como sua a missão evangelizadora da Igreja.

Conclusão

A Igreja recebeu do Ressuscitado a tarefa de evangelizar o mundo sob o influxo do Espírito Santo doado por Ele (cf. Mc 16,15; Jo 20,21-23); é a sua missão. O Papa João Paulo II freqüentemente se referia à evangelização ligando-a fortemente ao termo missão. Ele afirmava que é necessário que a “iniciativa de amor vivificante, que parte do Pai Celeste e culmina em Jesus Cristo, se estenda e quase se espraie em dimensão universal, para envolver toda a humanidade em uma nova criação”[9]Missão e evangelização guardam, portanto, uma relação muito próxima. Paulo VI já dizia que “Evangelizar é a graça e a vocação da própria Igreja, a sua identidade mais profunda. Esta existe para evangelizar”[10].

A vocação das e nas Comunidades Novas tem por finalidade a colaboração nesta missão da Igreja: a evangelização dos povos. Os carismas das Comunidades Novas, bem como as vocações pessoais de cada um de seus membros, são concedidos por Deus para o serviço dos demais irmãos e irmãs, para o serviço da Igreja e do mundo. É na evangelização que convergem as vocações das Comunidades Novas e as vocações nas Comunidades Novas. A afirmação de Papa Bento XVI aos membros dos Movimentos eclesiais e Comunidades Novas reunidos com ele, na Praça de São Pedro, para viver o Pentecostes 2006, é bastante reveladora: “Caros amigos, vos peço que sejais ainda mais, muito mais, colaboradores no ministério apostólico universal do Papa, abrindo as portas a Cristo”[11]. As Comunidades Novas e seus membros a isso são chamados: à missão da evangelização. Essa é a sua maior vocação.